29 de outubro de 2013

Na rede


Por Moema Ameom

Estava deitada na rede mergulhada em imensos vagalhões emocionais. Neles navegava  com certa tranqüilidade interior. Era um belo entardecer cuiabano. Em minhas preces pedia força para não fraquejar diante de mim mesma.


Buscava um porto seguro para entregar-me aos pensamentos, quando minha neta surgiu e jogou-se em meu colo. Abraçando-me fortemente questionou: ”Porque você esta triste, vovó?” Logo a seguir, sem espaço para a resposta, começou a falar comigo da mesma maneira como eu falava com ela quando era bebê, ali naquele mesmo lugar: ”Olha! As estrelas estão aparecendo! Vamos conversar com a D.Acácia para ela dançar pra você.” O vento começa a soprar; folhas e flores da bela Acácia dão início a harmoniosos movimentos. “ Viu só,vó! Elas estão conversando com você!” Enquanto fala me acaricia, dá muitos beijos dizendo “vai passar tudo”.


Se havia emoção revirada, agora havia emoção desaguada! As ondas de retorno conduziam-me a aprendizados colhidos juntas nestes quase quatro anos de convivência onde a distância física nunca nos impediu de ficarmos próximas.


De repente, ela sai da rede e começa a me balançar. “Lavínia, balança de vagar. Vovó não gosta da rede indo alto. Pode machucar você!” “Vó, precisa ser alto pra você ficar forte.” A palavra forte me desperta e eu vejo ali a mensageira do Universo a quem havia elevado meus pedidos. Apesar dos temores, entrego-me. Ela mostra com seus saltos e volteios que o receio focado nela era infundado. Meus medos infantis vão surgindo; medos adquiridos pela falta da vivência. Medos que não eram meus. Medos provenientes dos adultos que me rodeavam. O peito aperta, a angústia surge e eu quase grito: “Pára, Lavínia!” Ela ri, canta, dança e segue adiante! Imediatamente, algo explode em meu peito e eu começo a respirar diferente. Um forte jato de ar me revira por dentro, a vista turva, a pulsação acelera e ela então, com peraltice tranqüila vai parando a rede e salta para o meu colo. Muitos beijos e carinhos. “Pronto, vovó! Vamos brincar?”


Procuro levantar; não consigo. Vem o enjôo. Penso: minha bela terapeuta abriu um novo caminho no meu neurovegetativo. “Daqui apouco eu vou, querida!” Ela vai, eu fico. Os pensamentos tecem uma rede límpida de raciocínio sobre o acontecido e imediatamente insights da minha infância surgem descortinando-me os jogos familiares que distorceram meu caminho. Mais uma vez eles se aproximam de mim, mas, desta vez, novos movimentos vitais me acompanham.


À noite ao me preparar para dormir, meu doce anjo, começa a me cobrir com um lençol estampado. Diz: ”Fica bem quietinha, vó. Preciso cobrir você.” “Mas eu estou com calor, querida!” “É pra cuidar de você.” Depois que me cobre inteira, descobre meus pés e diz: ” Agora vou fazer massagem pra você dormir. Massagem no pé dá sono, né vó?” Mais uma vez os aprendizados se entrecruzam; todas as noites ela recebe massagens no corpo inteiro dos pais. Eu recebendo o que ensinei. Paraíso!


 No torpor do sono que chega paulatinamente, olho para o lençol e vejo-o totalmente vermelho sangue. Lembro-me que, à tarde, ao organizar o batizado do meu neto Luke que se aproxima, vi ser esta a cor do dia em que celebraremos a cerimônia. Pronto! Posso dormir.


Sonho com diversas situações de minha infância em que minha mãe e minha tia faziam-me de joguete para suas “birras” familiares. Ao acordar consigo enxergar o porquê dos vagalhões emocionais que me jogaram na rede; uma rede que não faz parte de meu caminho mas na qual fiquei me balançando por longos 63 anos, com medo de machucar quem me balançava.


Novo amanhecer. Sou abençoada com a visita de quatro papagaios que pousam diante de mim e de minha filha nos galhos da Amendoeira do fundo do quintal. Quatro. Sobrevoam nossas cabeças inebriando-nos com a beleza de seus vôos e gritos.


E assim o tempo FLUI!


27/10/2013

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